Quorum: limite e modelo olímpico

Renato J. Costa Valladares

 

 

 

 

 

 

 

Renato J. Costa Valladares, Professor e Escritor, é Doutor em Ciências e Mestre em Matemática.

 

RIO [ ABN NEWS ] — Quando eu estava escrevendo “O Jeito Matemático de Pensar”, soube que o cálculo do quórum de 3/5 da câmara de vereadores de uma importante cidade, tinha uma inadequação matemática. Estudei o assunto e o coloquei no livro.

Tempos depois um aluno interessou-se pelo tema que foi usado em sua monografia, sob minha orientação. Dentre as pesquisas necessárias o aluno constatou que além da câmara municipal, a inadequação também era utilizada na assembleia estadual.

É possível que outros professores e alunos tenham feito trabalhos semelhantes ao nosso. Não se pode descartar a hipótese que estes trabalhos tenham sensibilizado as autoridades municipais e estaduais e o problema tenha se resolvido. Por este motivo vou substituir a prefeitura e o estado acima, por um país imaginário que usa o mesmo procedimento em suas assembleias regionais e nacional. O procedimento para calcular o quórum de 3/5 é o seguinte.

a) Se o número de congressistas for múltiplo de 5, este número será dividido por 5 e depois, multiplicado por 3.

b) Se o número de congressistas não for múltiplo de 5, serão somadas tantas unidades quantas necessárias para se obter um múltiplo de 5 e, em seguida, divide-se este número por 5 e multiplica-se por 3.

Suponhamos que uma das assembleias regionais tem 37 congressistas. Como 37 não é múltiplo de 5, o quórum de 3/5 nesta assembleia recai no item (b). É fácil ver que somando 3 unidades obtemos (37 + 3 =) 40 que é o primeiro múltiplo de 5 após 37. Seguindo as instruções do item (b), obtemos (40 -:- 5) x 3 = 24. Isto mostra que seriam necessários no mínimo 24 votos favoráveis para que um projeto fosse aprovado.

Se a assembleia nacional tiver 370 congressistas o quórum recai no item (a), porque 370 é múltiplo de 5. Logo o quórum será (370 -:- 5) x 3 = 222.

Dividindo 370 -:- 10 = 37 vemos que a assembleia regional é um décimo da assembleia nacional. Dividindo o quórum da assembleia nacional por 10, tem-se 22,2. Como 24 é maior que 22,2, vemos o quórum da assembleia regional é maior que 1 décimo do quórum da assembleia nacional. Isto é, há uma desproporção entre o quórum da assembleia regional e o da assembleia nacional.

Em um primeiro momento pode-se pensar que isto ocorre porque 22,2 é um número fracionário e, por isso, não pode quantificar votos, pois estes são inteiros. Isto é verdade, mas as coisas podem ser mais bem feitas. Para ver isto observemos que 23 é um número inteiro maior que 22,2. Usando uma calculadora simples é fácil ver que (37 -:- 5) x 3 também é 22,2. Logo o procedimento matematicamente adequado seria usar 23 e não 24 votos para aprovar um projeto na assembleia regional.

Como o número 24 decorreu do item (b) vemos que a impropriedade matemática está no item (b) que acrescenta números que quantificam votos inexistentes. Para superar esta inconveniência vamos trocar os itens (a), (b) pelo item (c) abaixo. Como (c) é muito simples vemos que um único item simples supera matematicamente dois itens complicados.

c) Divide-se o número congressistas por 5 e depois multiplica por 3, obtendo um número X. O quórum será o primeiro número inteiro maior ou igual a X.

Isto é, se X for um número inteiro então é o quórum. Se X não for inteiro, o quórum será o 1º número inteiro maior que X. Netas condições, o número X é um limite mínimo para que um projeto seja aprovado. Como X pode não ser inteiro, acabamos de ver que um número não inteiro pode limitar números inteiros. Esta conclusão se aplica a muitos tipos de limite, mas isto ultrapassa o presente artigo.

O X da assembleia regional é X = 22,2. Este número não é inteiro e o primeiro inteiro maior que ele é 23. Isto confirma que 23 é mais adequado para quórum que o 24 da regra (b).

Para superar qualquer dúvida vamos imaginar uma situação parecida que é modelada nos treinamentos de um atleta para participar nos 100 metros rasos, nas próximas Olimpíadas. Para fazer os treinamentos, marcam duas faixas transversais na pista de treinos. Uma faixa é para largar e a outra, cem metros à frente, para chegar.

Como as passadas do atleta podem não medir exatamente 1 metro, é possível que na última passada o pé toque a faixa de chegada ou que a ultrapasse. Isto é, o corredor pisa na faixa ou pisa à frente dela. Desta forma a faixa dos cem metros corresponde ao X do quórum.

Se o leitor quiser pode falar com o autor pelo e-mail rjcvalladares@gmail.com

 


 

 

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